O ex-governador de Minas Gerais Eduardo Azeredo (PSDB), 69, se entregou à Polícia Civil nesta quarta-feira (23), para iniciar o cumprimento de pena de 20 anos e um mês de prisão por peculato (desvio de dinheiro público) e lavagem de dinheiro. É o primeiro acusado no chamado mensalão tucano a ser preso.
A prisão ocorre 20 anos após os fatos que motivaram as acusações e 11 anos após a denúncia.
O ex-governador Azeredo deixou a delegacia por volta das 16h10. Ele saiu pela garagem já dentro de uma viatura da Polícia Civil rumo ao Instituto Médico Legal, na zona oeste.
Houve protesto de pessoas que acompanhavam a movimentação na delegacia, com batidas na janela do carro e gritos de ladrão. Outros ainda comemoravam a prisão de um político do PSDB depois de 20 anos desde os fatos do mensalão tucano.
A polícia bloqueou uma pista nos dois sentidos da av. do Contorno, na região centro-sul, para a passagem de duas viaturas.
Depois do exame de corpo de delito, Azeredo foi encaminhado para cumprir pena em batalhão dos Bombeiros na zona centro-sul, a cerca de 1 km do endereço do seu apartamento.
Por determinação da Justiça, ele deverá cumprir pena em uma sala especial, em virtude do seu cargo.
Azeredo perdeu todos os recursos no Tribunal de Justiça de Minas, inclusive os embargos de declaração julgados nesta terça – considerado o último recurso possível antes da prisão em segunda instância. O tucano sempre negou que tenha qualquer participação em irregularidades.
Também nesta quarta, o ministro Jorge Mussi, do STJ (Superior Tribunal de Justiça), negou o pedido de habeas corpus ao ex-governador.
Antes de ter sua prisão determinada, Azeredo disse confiar no habeas corpus. A peça da defesa pedia que ele permanecesse em liberdade ao menos até a publicação do acórdão do Tribunal de Justiça, para que pudesse, ao entrar com recursos no STF e no STJ, pedir o efeito suspensivo da aplicação da pena.
De qualquer forma, seus advogados já informaram que irão recorrer aos tribunais superiores quando o acórdão for publicado.
PENA
Segundo decisão da Justiça de Minas, Azeredo deve cumprir pena em batalhão militar sem uso de algemas ou de uniforme do sistema penitenciário.
A preferência, diz a Justiça, é por uma unidade dos Bombeiros "dado o fluxo menor de pessoas, o que permitirá mais segurança ao sentenciado".
"É fato notório que as unidades penitenciárias mineiras passam por problemas de toda sorte", afirma o juiz Luiz Carlos Rezende e Santo, da Vara de Execuções Penais.
O juiz destaca que as prisões masculinas da região metropolitana têm centenas ou milhares de presos e destaca a necessidade de proteção do ex-governador.
"O ex-governador reclama segurança individualizada bem como tem prerrogativa de manter-se em unidade especial como a Sala de Estado Maior que deverá estar instalada no Comando de Batalhão Militar".
"O sentenciado possui vasta participação na vida política nacional por força de democrática escolha popular, sendo inegável o respeito que se deve dispensar a esta vontade, outrora exercia, e por isto mesmo há regramento próprio de proteção a pessoas que desempenharam funções relevantes na República", afirma a decisão.
O juiz diz ainda que Azeredo pode levar suas próprias roupas, "bem como vestuário para banho e cama mínimos para sua dignidade".
A decisão determina também que sejam fornecidos agentes penitenciários para o acompanhamento carcerário de Azeredo no batalhão militar.
O CASO
O mensalão tucano é considerado o embrião do esquema de mesmo nome relacionado ao PT e, segundo o Ministério Público, aconteceu durante a fracassada campanha de reeleição de Azeredo ao governo mineiro em 1998.
Em 2007, a Procuradoria-Geral da República denunciou ao STF (Supremo Tribunal Federal) 15 pessoas por um esquema de desvio de R$ 3,5 milhões em recursos estatais e empréstimos fictícios que abasteceu a campanha de Azeredo.
Além de Azeredo, que era senador à época, se tornaram réus o publicitário Marcos Valério, que foi condenado por operar o mensalão petista, e seus sócios, o ex-senador Clésio Andrade (MDB), entre outras pessoas.
José Afonso Bicalho, então presidente do Bemge (o extinto banco estatal de Minas) e atual secretário da Fazenda do governo de Minas Gerais, comandado por Fernando Pimentel (PT), também é réu. Todos eles negam ter cometido crimes.
Embora outros três acusados já tenham sido condenados em primeira instância, Azeredo foi o único condenado em segunda instância e, portanto, teve a prisão decretada seguindo entendimento do STF.
A primeira condenação de Azeredo veio em dezembro de 2015, quando foi condenado pela juíza da 9ª Vara Criminal Melissa Pinheiro Costa Lage a 20 anos e 10 meses de prisão.
À época, disse à Folha que a magistrada "praticamente copiou" a acusação feita pela Procuradoria-Geral da República desde 2007, usando como provas documentos que, segundo ele, são falsificados.
Azeredo afirmou que não era responsável pelas despesas da campanha e que não pode ser responsável por ações de terceiros. "Eu não posso me responsabilizar por atos de setores que tinham autonomia financeira", afirma.
Também questionou o acúmulo de penas para que a sentença chegasse aos 20 anos de prisão. "Ela multiplicou a pena porque eram várias cotas de patrocínio, só que nenhuma dessas cotas foram assinadas por mim. É isso. É muito simples", diz.
Azeredo recorreu da decisão, em liberdade, ao Tribunal de Justiça de Minas. Em agosto passado, por dois votos a um, os desembargadores mantiveram a condenação em segunda instância. Desde então, Azeredo teve três recursos negados na corte.
TRAJETÓRIA
Nascido em setembro de 1948 em Belo Horizonte (MG), Azeredo foi vice-prefeito (1989-1990) e prefeito da capital mineira (1990-1992) e se elegeu ao governo em 1995, com o empresário Walfrido dos Mares Guia como vice —que também foi denunciado no esquema do mensalão tucano, mas suas acusações prescreveram.
Na sua campanha à reeleição, quando promotores e procuradores dizem que houve o esquema de desvios, Clésio foi o candidato a vice. A chapa perdeu para o candidato Itamar Franco (MDB).
Em 2003, Azeredo tomou posse no Senado, onde ficou até o fim do mandato. Foi presidente nacional do PSDB de janeiro a outubro de 2005, quando o esquema do mensalão tucano foi desvelado e ele deixou o cargo.
Em 2010, foi eleito deputado federal, cargo que renunciou em 2014, ao se tornar réu no STF. Clésio Andrade, então senador, também renunciou. Com a perda do foro especial, o processo voltou à primeira instância, na Justiça estadual de Minas.
No último dia 14, Clésio Andrade também foi condenado, em primeira instância, a 5 anos e 7 meses de prisão por lavagem de dinheiro. Sua defesa diz que a condenação é injusta e que irá recorrer.
Em Belo Horizonte, Azeredo passou a prestar consultoria para a Fiemg (Federação das Indústrias de Minas Gerais) com um salário de R$ 25 mil ao mês.
Outros acusados no mensalão tucano
Condenados em primeira instância, podem recorrer em liberdade
- Renato Caporali Cordeiro, ex-diretor de estatal
- Eduardo Pereira Guedes Neto, ex-secretário adjunto de Comunicação
- Clésio de Andrade, ex-senador de Minas (PSDB)
Julgamento em primeira instância próximo
- Marcos Valério, publicitário
- Ramon Hollerbach, sócio
- Cristiano Paz, sócio
Punibilidade extinta por prescrição
- Walfrido dos Mares Guia, ex-vice-governador de Minas
- Cláudio Mourão, tesoureiro da campanha de Azeredo
- Lauro Wilson, ex-diretor de estatal
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